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sábado, 12 de maio de 2012

FREI DEMÉTRIUS - INTRODUÇÃO BÍBLICA - Como a Bíblia chegou até nós - PARTE 3:


De modo nenhum essa lista é completa. Outros são conhecidos,
mesmo alguns muito interessantes que vieram à luz quando da descoberta
dos rolos do mar Morto. Dentre esses estão o Gênesis apócrifo e Guerra
dos filhos da luz contra os filhos das trevas etc. (v. cap. 12).
Os livros questionados por alguns — antilegômeno
A natureza dos antilegomena
Os livros que originariamente eram aceitos como canônicos, e
* Bâruque está relacionado entre os apócrifos (v. p, 92).
mesmo mais tarde também assim reconhecidos, tendo sido, porém, objeto
de grave controvérsia entre os rabis, durante o processo de canonização,
são de grande interesse para nós. No capítulo anterior, vimos como todos
os 39 livros do Antigo Testamento foram de início aceitos pelo povo de
Deus, vindos dos profetas. Durante os séculos seguintes, surgiu e
desenvolveu-se uma escola de pensamento diferente, dentro do judaísmo,
que passou a questionar/entre outras coisas, a canonicidade de certos livros
do Antigo Testamento que, antes, haviam sido canonizados. Por fim, tais
livros foram reconduzidos ao cânon sagrado, por haver prevalecido a
categoria de inspirados que lhes havia sido atribuída de início. No entanto,
em vista de tais livros terem sido, nesta ou naquela época, difamados por
alguns rabis, passaram a chamar-se "antilegomena".
O número dos antilegomena
A canonicidade de cinco livros do Antigo Testamento foi
questionada I numa ou noutra época por algum mestre do judaísmo:
Cântico dos Cânticos, Eclesiastes, Ester, Ezequiel e Provérbios. Cada um
deles tornou-se controvertido por razões diferentes; todavia, no fim
prevaleceu a autoridade divina de todos os cinco livros.
Cântico dos Cânticos. Alguns estudiosos da escola de Shammai
consideravam esse cântico sensual em sua essência. Sabidamente numa
tentativa de abafar a controvérsia e defender a canonicidade do Cântico dos
Cânticos, o rabino Aquiba escreveu o seguinte:
Livre-nos Deus! Ninguém jamais em Israel criou controvérsia acerca
do Cântico dos Cânticos, alegando não tornar imundas as mãos [i.e., não
ser canônico]; todas as eras somadas não equivalem ao dia em que o
Cântico dos Cânticos foi dado a Israel Todos os Escritos são santos, mas o
Cântico dos Cânticos é o Santo dos Santos. 11
Como bem observaram alguns, o simples fato de surgir uma
declaração desse teor dá mostras de que alguém duvidou da pureza desse
11 Herbert DANBY, The Mishnah, Oxford, Oxford University Press», 1933, p, 782.
livro. Quaisquer que tenham sido as dúvidas voltadas para o alegado
caráter sensual do Cântico dos Cânticos, foram mal orientadas. É muito
mais provável que a pureza e a nobreza do casamento façam parte do
propósito essencial desse livro. Sejam quais forem as questões levantadas a
respeito das várias interpretações, não deve prevalecer nenhuma dúvida
concernente à inspiração desse livro, desde que seja visto da perspectiva
espiritual correta.
Eclesiastes. A objeção que às vezes é atirada contra esse livro é que
ele parece cético. Alguns até o têm chamado O cântico do ceticismo. O
rabino Aquiba dizia: "Se há algo em questão, a questão gira em torno só do
Eclesiastes [e não do Cântico]".12 Não resta a menor dúvida a respeito do
tom às vezes cético do livro: "Vaidade das vaidades [...] tudo é vaidade!
[...] nada há novo debaixo do sol [...] na muita sabedoria há muito enfado;
o que aumenta o conhecimento aumenta a tristeza" (Ec 1.2,9,18).
O que se negligencia quando se acusa o livro de ceticismo é tanto o
contexto dessas declarações quanto a conclusão geral do livro. Qualquer
pessoa que procure a máxima satisfação "debaixo do sol" com toda certeza
há de sentir as mesmas frustrações sofridas por Salomão, visto que a
felicidade eterna não se encontra neste mundo temporal. Além do mais, A
conclusão e o ensino genérico desse livro todo estão longe de ser céticos.
Depois "de tudo o que se tem ouvido", o leitor é admoestado, "a conclusão
é: Teme a Deus, e guarda os seus mandamentos, pois isto é todo o dever do
homem" (Ec 12.13). Tanto no que se refere ao Eclesiastes, Como ao
Cântico dos Cânticos, o problema básico é de interpretação do texto, e não
de canonização ou inspiração.
Ester. Em vista da ausência do nome de Deus nesse livro, alguns
pensaram que ele não fosse inspirado. Perguntavam como podia um livro
ser Palavra de Deus se nem ao menos trazia o seu nome. Além disso, a
história do livro parece ter natureza puramente secular. O resultado é que
se fizeram várias tentativas para explicar o fenômeno da aparente ausência
do nome de Deus em Ester.
12 Ibid.
Alguns acreditaram que os judeus persas não estavam na linhagem
teocrática, e por isso o nome do Deus da aliança não se relacionava a eles.
Outros sustentam que a omissão do nome de Deus é proposital, a fim de
proteger o livro da possibilidade do plágio pagão: o nome de Deus ser
substituído por um falso deus. Ainda outros conseguem ver o nome de
Jeová ou Iavé (YHWH) num acróstico em quatro momentos cruciais na
história, o que em si eliminaria a possibilidade. Seja qual for a explicação,
uma coisa é certa: a ausência do nome de Deus é compensada pela
presença de Deus na preservação de seu povo. Ester e as pessoas que a
cercavam eram devotas: prescreveu-se um jejum religioso, e Ester exerceu
grande fé (Et 4.16). O fato de Deus haver concedido grande livramento,
como narra o livro, serve de fundamento e razão da festa judaica do Purim
(Et 9.26-28). Basta esse fato para demonstrar a autoridade atribuída ao
livro dentro do judaísmo.
Ezequiel. Havia pessoas dentro da escola rabínica que pensavam que
o livro de Ezequiel era antimosaico em seu ensino. A escola de Shammai,
por exemplo, achava que o livro não estava em harmonia com a lei
mosaica, e que os primeiros dez capítulos exibiam uma tendência para o
gnosticismo. É claro, então, que, se houvesse contradições no livro, ele não
poderia ser canônico. No entanto, não se verificaram contradições reais em
relação à Tora. Parece que outra vez teria sido mera questão de
interpretação, e não de inspiração.
Provérbios. A objeção a Provérbios centrava-se no fato de alguns dos
ensinos do livro parecerem incompatíveis com outros provérbios. Falando
dessa alegada incoerência interna, assim diz o Talmude: "Também
procuraram esconder o livro de Provérbios, porque suas palavras se
contradiziam entre si" ("Shabbath", 30b). Uma dessas supostas
contradições encontra-se no capítulo 26, em que o leitor é exortado a
responder e ao mesmo tempo não responder ao tolo segundo sua tolice:
"Responde ao tolo segundo a sua estultícia, para que não seja ele sábio aos
seus próprios olhos" (Pv 26.4,5). Todavia, como outros rabis têm
observado, o sentido aqui é que há ocasiões em que o tolo deve receber
resposta de acordo com sua tolice, e outras ocasiões em que isso não deve
ocorrer. Visto que as declarações estão explicitadas em versículos
sucessivos, forma legítima da poesia hebraica, quem os redigiu não viu
nenhuma contradição.' A frase qualificativa que indica se alguém deveria
ou não responder a um tolo revela que as situações que exigem reações
diferentes também são diferentes. Não existe contradição em Provérbios
26, nenhuma contradição ficou demonstrada em nenhuma outra passagem
de Provérbios, e, por isso, nada atravanca o caminho da canonicidade.
Os livros aceitos por alguns — apócrifos
O âmbito mais crucial de desacordo a respeito do cânon do Antigo
Testamento entre os cristãos é o debate sobre os chamados livros apócrifos.
Em suma: esses livros são aceitos pelo católicos romanos como
canônicos e rejeitados por protestantes e judeus. Na realidade, os sentidos
da palavra apocrypha refletem o problema que se manifesta nas duas
concepções de sua canonicidade. No grego clássico, a palavra apocrypha
significava "oculto" ou "difícil de entender". Posteriormente, tomou o
sentido de esotérico, ou algo que só os iniciados podem entender, não os de
fora. Pela época de Irineu e de Jerônimo (séculos III e IV), o termo
apocrypha veio a ser aplicado aos livros não-canônicos do Antigo
Testamento, mesmo aos que foram classificados previamente como
"pseudepígrafos". Desde a era da Reforma, essa palavra tem sido usada
para denotar os escritos judaicos não-canônicos originários do período
intertestamentário. A questão diante de nós é a seguinte: verificar se os
livros eram escondidos a fim de ser preservados, porque sua mensagem era
profunda e espiritual ou porque eram espúrios e de confiabilidade
duvidosa.
Natureza e número dos apócrifos do Antigo Testamento
Há quinze livros chamados apócrifos (catorze se a Epístola de
Jeremias se unir a Baruque, como ocorre nas versões católicas de Douai).
Com exceção de 2 Esdras, esses livros preenchem a lacuna existente entre
Malaquias e Mateus e compreendem especificamente dois ou três séculos
antes de Cristo. Na página seguinte se podem ver suas datas e
classificação:
Argumentos em prol da aceitação dos apócrifos do Antigo Testamento
Os livros apócrifos do Antigo Testamento têm recebido diferentes
graus de aceitação pelos cristãos. A maior parte dos protestantes e dos
judeus aceita que tenham valor religioso e mesmo histórico, sem terem,
contudo, autoridade canônica. Os católicos romanos desde o Concilio de
Trento têm aceito esses livros como canônicos. Mais recentemente, os
católicos romanos têm defendido a idéia de uma deuterocanonicidade, mas
os livros apócrifos ainda são usados para dar apoio a doutrinas
extrabíblicas, tendo lido proclamados como livros de inspiração divina no
Concilio de Trento. Outros grupos, como os anglicanos e várias igrejas
ortodoxas, nutrem deferentes concepções a respeito dos livros apócrifos. A
seguir apresentamos Um resumo dos argumentos que em geral são
aduzidos para a aceitação desses livros, na crença de que detêm algum tipo
de canonicidade:
1.Alusões no Novo Testamento. O Novo Testamento reflete o
pensamento i registra alguns acontecimentos dos apócrifos. Por exemplo, o
livro de Hebreus fala de mulheres que receberam seus mortos pela
ressurreição Hb 11,35), e faz referência a 2 Macabeus 7 e 12, Os chamados
apócrifos ou pseudepígrafos são também citados em sua amplitude pelo
Novo Testamento (Jd 14,15; 2Tm 3.8).
2.Emprego que o Novo Testamento faz da versão dos Septuaginta. A
tradução grega do Antigo Testamento hebraico, em Alexandria, é
conhecida como Septuaginta (LXX). É a versão mais citada pelos autores do
Novo Testamento e pelos cristãos primitivos. A LXX continha os livros
apócrifos. A presença desses livros na LXX dá apoio ao cânon alexandrino,
mais amplo, do Antigo Testamento, em oposição ao cânon palestino, mais
reduzido, que os omite.
3.Os mais antigos manuscritos completos da Bíblia. Os mais antigos
manuscritos gregos da Bíblia contêm os livros apócrifos inseridos entre os
livros do Antigo Testamento. Os manuscritos Aleph, A e B (v. Cap. 12)
incluem esses livros, revelando que faziam parte da Bíblia cristã original.
4. A arte cristã primitiva. Alguns dos registros mais antigos da arte
cristã refletem o uso dos apócrifos. As representações nas catacumbas às
vezes se baseavam na história dos fiéis registrada no período
intertestamentário.

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